Tribunal Pleno - Sessão de 23.05.2001 - Item 23
Consulta TC-021734/026/2000
Consulente: Câmara Municipal de Santa Adélia - Presidente - Gerson Formigoni.
Assunto: Consulta sobre despesas com pessoal após a edição da Lei Complementar nº 101/2000.
RELATÓRIO
Trata-se de consulta formulada pelo Presidente da Câmara de Santa Adélia, Sr. Gerson Formigoni, buscando desta E. Corte orientação para solucionar dúvida existente acerca do limite de despesas de pessoal surgida em razão do conflito havido entre a redação dada ao artigo 29-A, § 1º, da Constituição Federal1 e as regras do art. 20, inciso III, alínea "a", da Lei Complementar 101/20002, a saber:
a) o disposto no artigo 29-A, § 1º, da C.F. de 1988, se harmoniza com o estatuído no art. 20, inciso III, letra "a", da L.C. nº 101, de 04/05/2000 ?
b) em caso negativo, qual dos dois limites previstos é prevalecente?
Unidade Jurídica de ATJ propõe a constituição de uma comissão mista, com integrantes da Assessoria Técnica Jurídica e Econômica da ATJ, para formulação de estudo e análise ante a relevância da matéria.
Divergindo, Chefia de ATJ entende que a consulta não deve ser conhecida por representar o seu enfrentamento prestação de serviço de assessoramento jurídico ao Legislativo Municipal.
Já SDG apresenta parecer abordando com propriedade a questão. No seu entender, quando o valor do cálculo para despesas de pessoal do Poder Legislativo Municipal estabelecido no art. 19, III, c.c.art. 20, III, "a", da Lei Complementar nº 101/2000 não ultrapassar o montante resultante daquele derivado da Constituição Federal, em seu artigo 29-A, § 1º, inexiste, por óbvio, qualquer inconstitucionalidade. Em caso de o valor encontrado pela aplicação da fórmula estipulada pela Lei de Responsabilidade Fiscal vir a ser superior ao limite fixado pela Constituição Federal, adotar-se-á este último, ou seja, o menor valor, em face do princípio da supremacia da Constituição.
É o relatório.
VOTO
Preliminar
O pedido atende aos pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.
Mérito
Pela simples leitura dos dispositivos mencionados na instrução processual, verifica-se a divergência entre as bases de cálculo e as alíquotas previstas na Constituição Federal e na Lei de Responsabilidade Fiscal para fins de despesa com pessoal do Poder Legislativo Municipal.
A Carta Magna em seu art. 29-A, incisos I a IV e § 1º, assim dispõe:
"Art. 29-A - O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior:
I - 8% (oito por cento) para Municípios com população de até 100.000 (cem mil) habitantes;
II - 7% (sete por cento) para Municípios com população entre 100.001(cem mil e um) e 300.000 (trezentos mil) habitantes;
III - 6% (seis por cento) para Municípios com população entre 300.001 (trezentos mil e um) e 500.000 (quinhentos mil)habitantes;
IV - 5% (cinco por cento) para Municípios com população acima de 500.000 (quinhentos mil) habitantes.
§1º A Câmara Municipal não gastará mais de 70% (setenta por cento) de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores".
Por sua vez, o art. 19, III, c.c. art. 20, III, "a", ambos da Lei de Responsabilidade Fiscal (L.C. nº 101/2000), prevê:
"Art. 19: Para os fins do disposto no caput do art. 1693 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:
(...)
III - Municípios: 60% (sessenta por cento)."
"Art. 20 A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:
(...)
III - na esfera municipal:
a) 6% (seis por cento) para o Legislativo(...);"
Convém consignar que tanto o art. 29-A, "caput", da Constituição Federal quanto o art. 19, § 1º, IV, da Lei Complementar nº 101/2000, excluem do total da despesa do Poder Legislativo Municipal os gastos com inativos.
O caput desse artigo 19 remete-nos ao art. 169 da Constituição Federal, o qual determina que os percentuais com gasto de pessoal, de todos os entes da Federação, não podem exceder os limites legais, uma vez que a Lei de Responsabilidade Fiscal é a norma que complementa a Constituição Federal nessa matéria.
Como verificou o Sr. Secretário Diretor Geral, com sensatez, a base de cálculo da Lei de Responsabilidade Fiscal é mais ampla que a base de cálculo disposta na Constituição Federal. Assim sendo, nos casos em que seja possível conciliar o produto decorrente do cálculo realizado conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal com o produto resultante do cálculo previsto na Constituição Federal, não há qualquer óbice no tocante à constitucionalidade do art. 20, III, "a", da Lei Complementar nº 101/2000. Saliente-se que tal situação pode ocorrer na hipótese de a receita corrente líquida, deduzida a contribuição e a compensação financeira prevista na alínea "c" do inciso IV do art. 2º da Lei de Responsabilidade Fiscal, propiciar resultado compatível e dentro dos limites impostos pelo art. 29-A, seus incisos e § 1º da Carta Magna.
Todavia, nas hipóteses em que o valor obtido pelo cálculo baseado nas regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, para fins de despesa de pessoal, for superior ao montante alcançado pelo cálculo decorrente das normas da Constituição Federal, há que prevalecer este último, em face da supremacia da Constituição em relação a todo o ordenamento infraconstitucional.
Pelo exposto, quanto à primeira questão formulada, entendo que o valor da despesa de pessoal do Poder Legislativo não pode ultrapassar o montante resultante do cálculo derivado da Constituição Federal. Quanto à segunda pergunta, em caso de o valor encontrado pela aplicação da fórmula estabelecida pela Lei de Responsabilidade Fiscal vir a ser superior ao limite fixado pela Constituição Federal, adotar-se-á este último, ou seja, o menor valor.
ROBSON MARINHO
Conselheiro
1 "Art. 29-A, § 1º, da C.F. : "A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seu Vereadores".
2 Art. 20, III, letra "a", da Lei 101/2000: "A repartição dos limites globais do artigo 19 não poderá exceder os seguintes percentuais(...) III - na esfera municipal: a) 6% (seis por cento) para o Legislativo".
3 Art. 169, caput: " A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar".